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segunda-feira, 3 de julho de 2017

HAMLET

Encontro e Apresentação da família e amigos do Hamlet. Direção Paulo de Moraes. Música de Rico Viana. Canções de Horácio -  Luiz Felipe Leprevost.   (Foto de João Gabriel Monteiro)
(No CCBB - Teatro I  - até dia 6 de agosto de 2017)

IDA VICENZIA
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial)

HAMLET

     "Se fossemos chicotear todos os idiotas do mundo, ninguém escaparia ao chicote" - diz Hamlet. E Shakespeare acrescenta: "Não se deve ampliar a voz dos idiotas". Acho que se ele vivesse agora teria um colapso ao ver o poder que tem a internet, de ampliar a voz dos idiotas... Pois eu sou mulher, talvez idiota, estou cozinhando e escrevendo sobre Hamlet! E a coisa que mais me empolga, no momento, é este Hamlet menino que não tem medo de se expor, de ser homem e mulher, e falar com sua própria voz!

     Nem quero me lembrar que Sarah Bernardt já interpretou Hamlet no cinema mudo! Não quero lembrar da "diva" gesticulando para encanto da burguesia francesa. Que tempero teria Hamlet, para eles? (Desculpem o "tempero", estou cozinhando...)

     E que gosto incrível quando Patricia Selonk, de óculos escuros, sentada em algo que certamente não é um trono, vestindo trajes contemporâneos, olha a cena que começa a se descortinar perante seus olhos de Hamlet, do amor entre sua mãe Gertrudes e seu tio Claudius. Ela (ele), que acabara de ouvir a voz do fantasma de seu pai, e, de repente Hamlet começa a falar! E sua intervenção nos amores dos dois traidores; a lembrança da voz de seu pai, o Rei, desperta a ironia do herói, com aquele fio de voz característico de Selonk, que a gente pensa que ninguém vai ouvir, mas que atinge o mais fundo do nosso ser.

     Como se não bastasse o olhar de Hamlet, prescrutador, de óculos escuros!, observando o mundo louco em que vive - e ele pode tudo ver e nos deixar ver, apesar de seus óculos escuros  - modernos, contemporâneos.

     A peça mostra um Hamlet alegre quando encontra a caveira de Yorik, e, ao recordar as travessuras daquele bobo da corte, é o menino que surge. E temos todas aquelas mudanças de cenas e de aparições de fantasmas em gigantescas projeções e voz toráxica. Estamos, realmente, presenciando um Hamlet louco, menino, e sua historia é contada (e cantada por Ofelia - Lisa Eiras) em loucura de voz de criar amores. O elenco cumpre seu papel sem dificuldade ou reverência. Estamos assistindo a um Shakespeare com personalidade própria. O que quero dizer com isso?

     Não há complicações de época, há a Rainha Gertrudes (Isabel Pacheco) bebendo seu vinho envenenado sem maiores dramas; há o tio Claudius, corrupto moderno, que tenta até o final trazer Hamlet para o seu lado, cooptá-lo. Polonius, em seu papel descoloriido; Ofelia enlouquecendo sutilmente, do outro lado da "loucura" de Hamlet. Assim vale a pena assistir novamente Hamlet. Aliás, nosso também grande diretor, Antonio Abujamra, costumava dizer que Hamlet era a dramaturgia mais completa, o início e o fim do drama, contendo nele todas as esperanças e conflitos. Abujamra lia Hamlet sempre que ia dirigir uma nova peça.

     Laertes e Horacio ... perfeitos. A cena do duelo se resolve como o grande engano que é. E o encontro do jogo de espadas entre Laertes (Jopa Moraes) e Hamlet (Patricia Selonk) seria descomplicado, crédulo e amoroso, um jogo de esgrima entre dois amigos, não fora a interferência do corrupto Claudius (Ricardo Martins).

     Enquanto o tio Claudius entra com o veneno, Horacio (Luiz Felipe Leprevost) é o amigo em quem se pode confiar. Temos também, nesta peça que nada esquece, o coveiro que faz as delicias da representação do povo em Shakespeare (ator Marcos Martins), e os dois amigos (que se tornam traidores), Rosencrantz e Guildenstern. Atores interpretam papéis dobrados, como Luiz Felipe Leprevost (Rosencrantz), e Jopa Moraes (Guildenstern) este último também o saltimbanco que se apresenta no castelo de Elsinor. Marcos Martins é Polonio e o coveiro. Como sempre, os atores desta Companhia de Paulo de Moraes são excelentes, e é um prazer assistir aos seus espetáculos.   

       Em conseqüência, o elenco de Hamlet é formado por sete atores (e a projeção em vídeo do fantasma, interpretado na possante visão e voz de Adriano Garib). Eles contam a historia do "reino podre da Dinamarca" criada por Shakespeare, mas o espetáculo consegue, sem fazer alarde (discretamente), algumas aferições que nos lembram certo país. Mas tudo é feito com muita discrição e charme.  

     Quanto ao cenário, o Castelo é a prisão e o "Campo Santo" é a liberdade! Carla Berri e Paulo de Moraes são os criadores deste ambiente, os cenógrafos. Saudemos o Hamlet menino interpretado por Patricia Selonk. Nunca pensei (pensamos) que fôssemos amar Hamlet tanto assim, novamente.  

     A Direção de Paulo de Moraes, da Armazém Companhia de Teatro é da maior criatividade. E a Versão Dramaturgica, corretíssima, é de Mauricio Arruda Mendonça. Com a Iluminação de Maneco Quinderé, as modificações da emoção ficam marcantes, como o vermelho apresentando e englobando a tragédia final. A Trilha Sonora Original é de Ricco Viana, e é muito boa. Figurinos atuais, com leves toques do passado, de Carol Lobato e João Marcelino. Preparação Corporal de Patricia Selonk e Coreografia de Toni Rodrigues. O Preparador de Esgrima é Rodrigo Fontes. Video de João Gabriel Monteiro. Canções de Horacio: Luiz Felipe Leprevost. Colaboração na Dramaturgia: Jopa Moraes e Paulo de Moraes. Assessoria de Imprensa Ney Motta. Patrocínio: Petrobras e Banco do Brasil. É BOM VER BOM TEATRO!       

     

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